"Renda-se, como eu me rendi.
Mergulhe no que você não conhece como eu mergulhei.
Não se preocupe em entender, viver ultrapassa qualquer entendimento."

(Clarice Lispector)

O Beijo

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Gustav Klimt (1907)
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quarta-feira, 18 de agosto de 2010

Tema de destaque 9 - As Doenças da Alma

Infelizmente, estamos diante de um problema de grandes proporções, que vai além do universo feminino. É inerente ao ser humano, quer esteja vivo de fato, ou simplesmente seja mais um sobrevivente da controversa sociedade contemporânea. Há até pouco tempo, quando se falava de algumas doenças em particular, fazia-se referência a grupos de risco ou ao fator genético herdado pelo histórico familiar. Hoje em dia, basta ser gente pra ser acometido pelo maior dos males da humanidade: a doença da alma. Quantos de nós não temos pra contar o caso de alguém próximo que sofreu as conseqüências de uma enfermidade rara, sem cura, sem explicação da origem, ou que foi descoberta em estágio terminal? O que dizer das doenças auto-imunes, que funcionam como um ataque do organismo a ele próprio, por acreditar, de uma hora para outra, que aquela área específica passou a ser um corpo estranho e precisa ser urgentemente aniquilada? E o câncer, mutação de células estranhas que crescem e se alimentam dos nossos nutrientes; sem comentários...

Quais são as razões para essa sucessão de perdas, danos, metamorfoses e mutações sem respostas aparentes, sem uma lógica inteligível à nossa forma de compreensão das coisas? Não há tempo de se defender, de dizer adeus, de realizar sonhos... Não é possível que ninguém se sinta incomodado com isso, que não queira rumos diferentes, que não tenha a vontade de cultivar o sonho de envelhecer até ficar com os cabelos bem branquinhos e com a pele bem enrrugadinha; sentar e tomar uma xícara de nostalgia com os mais jovens, se gabando dos feitos do passado! Será que estamos condenados de fato a desviar do caminho que realmente nos leva ao estado de saúde integral?

Não falo aqui como especialista no assunto, até porque, cada ser humano constitui um universo em si mesmo. Sendo assim, não tem como saber tudo sobre todos, o que seria uma falsa pretensão. É difícil opinar sobre nós mesmos, o que dirá sobre os outros... Contudo, chamo à atenção para a disseminação de alguns males que aparentemente surgem do nada, de forma avassaladora e em pessoas cada vez mais jovens. Registro aqui a experiência de uma mulher que optou por entender as origens dos seus próprios desajustes e que, exatamente por isso, encontrou-se em uma encruzilhada: exorcizar seus fantasmas ou dar continuidade ao ciclo vicioso de autoflagelação por meio da somatização de enfermidades que tinham origem na alma e se manifestavam no corpo físico.

Refletindo sobre o assunto, acabei me deixando sensibilizar pelo grupo de estudiosos da alma humana, como forma de buscar asilo e encontrar explicações para diversas manifestações da energia e das substâncias químicas ou originárias do nosso organismo, que ocorrem como resposta às descargas emocionais. Somos todos leigos ou temos o conhecimento bastante limitado sobre o assunto, mas as descobertas atuais são inegáveis, mesmo que não revelem tudo que se deva saber. Contudo, de todas elas, considero como mais importante a tomada de consciência. Não o conhecimento dos processos físicos nem das implicações técnicas científicas. Falo da tomada de consciência da unidade do conjunto de todas as partes que compõem o ser, bem como das relações de interdependência e interações que cada um desses universos desenvolve entre si. Falo daquele lampejo que nos remete à sensação de ter acabado de pensar em uma grande idéia. Aquela sensação do jovem que descobriu o mundo, sendo nesse caso, o nosso mundo interior.

Na roda viva em que nos encontramos hoje, de tudo precisamos saber um pouco, sendo que não dispomos de tempo para mais nada além da sobrevivência. Nesse mundo frenético e acelerado, não nos permitimos sentir em profundidade, tampouco compreender origens, efeitos e desdobramentos das experiências. Aguçar a percepção sistêmica é algo filosófico demais para quem tem pressa. Temos a sensação de que se pararmos um pouco, mesmo que seja para tomar fôlego, seremos atropelados pelo rolo compressor da vida. Seremos deixados para trás sem a chance de retomar a linha de frente. Não importa se não sabemos onde estamos indo. A lei suprema nos impele a acompanhar a multidão e seguir sempre em uma direção qualquer que seja ela. O primeiro resultado dessa dinâmica rebate no sentimento de vazio, na falta de sentido, na frustração em função da sensação de perda da autonomia sobre as nossas próprias escolhas.

Certa vez, ouvi a descrição de algo parecido, a partir da analogia com a escolha de frutas em um pomar. Sucessivamente, em importantes fases da vida, o indivíduo tomava a decisão de escolher a fruta que acreditava fornecer o alimento necessário à alma naquele determinado momento. Contudo, sempre acabava escolhendo outra, devido a diversos fatores circunstanciais. No final de um tempo, sentia-se confuso e em parte, perdido em seu próprio mundo. Não sabia se aquela trajetória tinha sido fruto de suas convicções ou se apenas tinha sido levado pelo vento que soprou na direção mais forte. Por essas e outras razões, pessoas aparentemente saudáveis adoecem por dentro. O desequilíbrio entre o atendimento ao chamado do mundo externo e o do coração nos conduz a uma situação de fragilidade, estando mais suscetíveis à deterioração da nossa carapaça coloidal. As sucessivas e, às vezes, ininterruptas descargas emocionais consideradas nocivas ao organismo fomentam repetidas tendências de experimentação dos sentidos, resultando em somatizações, que nada mais são do que estigmas da alma no corpo.

Portanto, entender minimamente sobre nós mesmos, sobre nossas referências, origens e sentimentos, é o passo indispensável para quem quer se proteger desses males intangíveis. É a vacina e ao mesmo tempo o antídoto; a cura e a prevenção. É a fonte de todas as respostas, para todos os enigmas do universo, para as razões de sermos quem somos, de existirmos. Por tudo isso, tenho um desejo do tamanho do mundo. Parece factível à primeira vista, mas requer o mergulho no autoconhecimento, que é um caminho imprevisível, intenso e repleto de surpresas, sem falar que dura para todo o sempre. É o caminho que leva à integralidade, à plenitude, ao pote de ouro escondido em cada um de nós. Depois dessas descobertas, para compreender melhor como minhas emoções se manifestam, e até para poder conduzi-las ao que se entende como uma condição de equilíbrio. Não consigo começar minha jornada sem desejar algo diferente.

No fundo, para ser inteira, quero ter a sensação de ser livre sem atropelar os outros e de me sentir grande sem ter que ser maior do que a outra pessoa para me sentir segura comigo mesma. Quero ser livre para viver o que sinto por dentro, sabendo respeitar as diferenças de forma lícita, conhecida, anunciada, sem ter a necessidade de testar meus limites em termos de competição, em função dos meus medos ou dos meus traumas. Quero sentir-me livre de mim mesma, crescer, sair de mim e perder todos os pudores. Não tenho a pretensão de ser nem doida nem santa, apenas de ser eu mesma. Ser um ponto de interseção entre as limitações do mundo concreto e a abundância inerente à eternidade da alma, a materialização do intangível, a revelação da grandiosidade do ser humano. E na minha pequenez, consolidar os três mundos em um só: mente, corpo e alma.

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