"Renda-se, como eu me rendi.
Mergulhe no que você não conhece como eu mergulhei.
Não se preocupe em entender, viver ultrapassa qualquer entendimento."

(Clarice Lispector)

O Beijo

O Beijo
Gustav Klimt (1907)
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sexta-feira, 23 de julho de 2010

Tema de destaque 8 - Quando Eu Crescer


Um dia, quando eu crescer, quero ter descoberto qual é o meu lugar.
Depois de conhecer todas as paisagens e ter provado todos os sabores, quero saber aonde devo ir para me encontrar.
Mas primeiro, quero estar comigo mesma e desvendar os enigmas da minha alma, os segredos da minha sombra, a identidade que ainda não consigo decifrar.
Antes de chegar ao fim, mesmo que no último segundo, quero estar de volta ao começo de tudo para recordar a minha razão de ser, que permeia o meu espírito antes mesmo de ter sido concebida.
E, se não for possível nascer novamente, que ao menos eu possa me refazer à imagem e semelhança do que deveria ser e ainda não me tornei.
Quando eu crescer, quero ser de todos e ao mesmo tempo não pertencer a ninguém, apenas ser dona do meu eu e me guiar pelo caminho da transformação que me faz transcender.
Quero alcançar a plenitude, perder a pressa, desacelerar os batimentos do coração e não pensar em nada.
Quero ser capaz de esvaziar a mente mantendo intactas as memórias do que fui, as razões do que sou, o futuro que quero ser.
Quero ser muitos heterônimos em um só, ter todos os humores e personalidades que vivenciei desde quando estive no casulo até o momento em que me tornei uma borboleta cintilante e voei.
Não vou guardar segredo de nada, espantarei todos os medos, saberei de tudo um pouco e ao mesmo tempo terei a sensação de sentir-me menina no instante em que realmente me tornar gente.
Tentarei compreender a realidade de diferentes maneiras, disseminarei uma forma rara de dizer coisas com os olhos, de escutar por meio de sinais, de interpretar as mensagens truncadas e transformá-las em palavras de paz.
Quando eu crescer, quero ter em mim cada pedacinho infinitesimal que constitui a unidade do universo e ter descoberto a grandiosidade de um pequenino ponto de luz na imensidão negra do desconhecido.
Por isso, vou mergulhar até o fundo das águas calmas e turvas, irei nadar nas ondas do mar revolto e, como no princípio de tudo, molharei os pés cansados de andar numa nascente cristalina.
Mesmo que eu já saiba que todas as respostas de que preciso já estão dentro de mim, será preciso girar o mundo e romper meus limites para compreender o significado de cada uma delas.
Porque o ser só é grande quando se mostra e se assume por inteiro;
O toque só traz o poder da cura quando é capaz de penetrar a pele;
O cheiro apenas deixa saudade quando nos remete a um tempo bom, a uma pessoa importante ou a um lugar aconchegante;
O sabor das coisas apenas sacia a fome de viver quando traz consigo o tempero que nos desperta o interesse de experimentar a completude;
A beleza de uma imagem só tem significado quando se consegue perceber os detalhes do retrato mesmo que de olhos fechados;
E o som das coisas só pode ser de fato ouvido quando se escuta o chamado interior.

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